Estilista Guilherme Guimarães - RENATA FONSECA

terça-feira, 20 de abril de 2021

Estilista Guilherme Guimarães

Olá pessoal!

Estava olhando os stories da Linving Gazette – já fiz um post sobre oblog e insta - a Bárbara mostrava um vestido que comprou em um brechó on-line de um estilista brasileiro muito famoso na décadas 60,70 e 80 que eu nunca tinha ouvido falar Guilherme Guimarães.

Lógico que fui fazer uma pesquisa! Só achei um matéria que falava mais da vida desse grande profissional. 


Vamos saber sobre Guilherme Guimarães.

Em meados dos anos 60, Guilherme Guimarães era considerado o maior costureiro do Brasil. Seus vestidos de gala e de noiva eram, como se dizia na época, a coqueluche das grã-finas. Suas casas foram muitas. Ele tinha um apartamento na Avenida São Luís, no Centro de São Paulo, com um Miró na parede, e outro no Rio, no Flamengo.

Desde criança, Guilherme sempre foi fascinado pelo glamour social - do Brasil e do mundo -, pelas artistas de cinema, por objetos de decoração e roupas. Anotava tudo o que lia num caderninho e sabia quem casou com quem, como era o vestido, como eram as jóias, como foi à festa, o que foi servido e quem eram os convidados (isso, sem conhecer ninguém). Com essas preocupações, não podia ser um bom aluno. Passava as aulas desenhando vestidos e só se interessava por aprender inglês, francês e geografia.

Um dia, aos 14 anos, lia num jornal sobre um crime que acontecera no Rio e que se tornaria célebre: um homossexual havia sido morto por seu caso com um castiçal na cabeça. Sua mãe o viu e disse apenas uma frase: “Eu preferia ter um filho morto a ter um filho homossexual”. Guilherme estudava num colégio de padres barnabitas e, no dia seguinte, um dos homens de batina o chamou para dar uma notícia triste: Guilherme seria expulso do colégio. Mas por quê? Porque as mães dos outros alunos haviam feito um abaixo-assinado pedindo a expulsão, por ele ser “diferente”.

O garoto, que morava em Laranjeiras, passou o dia inteiro zanzando pelo bairro, sem saber o que fazer, como chegar em casa, como contar à mãe. Já de tarde, entrou nas Lojas Americanas para comprar um caderno de desenho e topou na porta com um rapaz que conhecia de vista, nadador do Fluminense. Em desespero, pensou: “Se ele me chamar, eu vou”. Ele chamou, Guilherme foi, e teve sua iniciação sexual.

 

Sem freqüentar mais o colégio, Guilherme começou a circular em torno da Praça Tiradentes, nos tempos em que Walter Pinto e Carlos Machado, como se dizia, arrasavam no teatro rebolado. Só havia um problema: ele não podia entrar, era menor de idade. Vidrado em mulheres bonitas, um dia viu na praia uma das coristas do clube Night and Day. Arriscou chegar perto e suplicou: “Meu sonho é ver uma peça de teatro. Você não podia me ajudar?”. A vedete, Marlene Rosário, disse-lhe que chegasse mais cedo e ela o levaria até o lugar onde ficava o iluminador. Guilherme foi e se deslumbrou com as moças, que desciam de um disco cobertas de plumas e paetês, cantando e dançando, quase nuas. Viu que seu futuro tinha de seguir por ali: roupas maravilhosas para mulheres maravilhosas. Descobriu assim a sua vocação.

Antes de poder realizá-la foi convocado a prestar o serviço militar. Uma noite, encontrou um amigo que, como ele, se tornaria costureiro famoso: Denner. Pediu um conselho, e o amigo lhe disse para fazer o que ele havia feito para escapar do Exército: raspar as pernas e, em vez de cuecas, vestir Zazá, uma calcinha famosa naqueles tempos, que existia nas cores rosa, amarelo e azul. Dito e feito. Quando Gui tirou as calças, todos os machões riram e o sargento caminhou firme em sua direção. “Você está isento!”, gritou-lhe o sargento. “Aqui é lugar de homem!” Era tudo que Guilherme queria ouvir.


Gui não sabia como concretizar sua vocação. Se fosse estudar, só seria alguém aos 30 anos, e ele tinha pressa. Queria ser famoso logo. Um amigo, que encontrou num lotação contou que a Varig estava fazendo um concurso para o uniforme das aeromoças; por que ele não tentava? Contou também que o resultado seria decidido pela poderosa Charlotte Franklin, diretora da companhia em Nova York, que chegaria ao Rio na manhã seguinte. Guilherme perguntou: “Do que ela gosta?”. “De rosas vermelhas”, foi a resposta. Na manhã seguinte, bem cedo, GG estava na porta do Hotel Glória, sobraçando um colossal buquê de rosas. Ficou horas ali, até que Charlotte chegou. Entregou-lhe as flores e os croquis para o concurso, que, aliás, ganhou. Prêmio: uma passagem para Nova York e US$500. Apaixonou-se pela cidade e foi ficando, ficando.

Charlotte, por sua vez, se afeiçoou a Guilherme e encomendou-lhe alguns vestidos, que ela provaria quando viesse ao Rio. Ele a convenceu a fazer o contrário: iria ele a Nova York para as provas dos vestidos. Para variar, o atilado carioca levou a melhor, ganhou uma ponte aérea Rio-NY e uma casinha alugada, por coincidência na Gay Street, no Village. Passava as tardes andando pela Sétima Avenida, o lugar dos atacadistas de moda, mostrando seus croquis. Às vezes, vendia algum por US$10, e assim ia vivendo. Conheceu pessoas, fez amizades e, através do amigo de um amigo de um amigo, chegou à poderosa Loretta Scanell, diretora da revista Town & Country. Marcou hora, levou os desenhos e teve como resposta um vago “Eu te ligo”.

 

Demorou, mas um dia ela ligou, convidando Gui para um chá no hotel onde um costureiro italiano estaria apresentando sua primeira coleção. Seu nome: Valentino. Nessa mesma tarde, Loretta sugeriu a GG fazer um desfile na cidade, e perguntou se ele tinha condições. Ele não tinha, mas disse que tinha. Soube então que havia uma grande fábrica em Petrópolis, com todos os tecidos de que precisaria. Tomou um ônibus, bateu na porta, pediu para falar com o dono e expôs a situação. “O senhor me daria os tecidos?”, perguntou, na maior candura. O empresário disse que sim, bastava que Guilherme dissesse quantos metros precisaria de cada um. Em três dias os croquis estavam prontos, e os cálculos das metragens, feitos. Telefonou a Loretta e marcaram a data do desfile. Havia um pequeno senão: ele deveria levar cinco manequins.

Cinco manequins quer dizer cinco passagens, fora hotel, cachês etc. A Varig, que patrocinou o desfile, ofereceu as passagens, mas só três. O cachê ficaria para a volta, quando ele vendesse a coleção. Como manequins, quando estão começando, topam qualquer coisa, tudo se resolveu lindamente. O desfile foi um sucesso e deu página inteira no New York Journal American, com foto de Guilherme, chamado de “Guillaume from Brazil”. A reportagem foi reproduzida na revista Manchete, e Gui chegou ao Rio já consagrado. Rapidinho, o grand monde começou a aparecer no seu pequeno ateliê, já com três costureiras contratadas. Recebeu um telefonema de Tônia Carrero, dizendo que ia a Londres para a estréia do filme The V.I.Ps e que precisava de vestidos para a viagem. Guilherme não só fez os vestidos, como foi levá-la ao aeroporto, com direito a foto na primeira página de O Globo.

 

Logo o ateliê ficou pequeno. GG alugou um apartamento maior e contratou mais costureiras. Corria o ano de 1968. Foi quando a rainha da Inglaterra veio ao Brasil. Boa parte das elegantes do Rio encomendou vestidos a Guilherme. Aos 25 anos, ele era rico e famoso, exatamente como havia jurado. Mas a consagração mesmo veio quando um dia telefonou Carmem Mayrink Veiga, que ele não conhecia, mas idolatrava furiosamente. Carmen queria vários vestidos para o verão, entre eles um de baile, vermelho, para usar com seus rubis. “No verão as mulheres só usavam jóias de turquesa, coral, marfim e jade; esmeraldas, safiras, rubis e diamantes, só no inverno. Havia também as bolsas de ouro, que se chamavam Farah Diba. Quem não tinha uma não era ninguém.”

Suas roupas foram notadas no Swan Ball, em Nashville, ele fez um desfile no Waldorf-Astoria, em Nova York, e outro para a marca Neiman Marcus, no Texas, vestiu a rainha da Suécia, conheceu Elke Maravilha e a levou para desfilar suas roupas na Suíça. Desenhou os uniformes, chiquérrimos, para o corpo feminino da Marinha. Foi chamado por Glauber Rocha para fazer os figurinos de Terra em transe - de graça, pois a produção não tinha dinheiro. Só ouviu do diretor uma recomendação: que as roupas fossem deslumbrantes.

 

Conta que o empresário André Brett pediu que ele fizesse uma coleção de prêt-à-porter e jeans. O salário seria de US$ 8 mil mensais. GG pensou, pensou e aceitou. Foi morar em Nova York. Viajava para o Brasil duas vezes por ano, para trabalhar nas coleções. Alugou uma town house na Rua 82, entre Madison e Park, e, como não tinha dinheiro para decorá-la do jeito que queria, colava pedacinhos de papel nas paredes e no chão. Num escrevia “quadro de Picasso”, noutro “escrivaninha francesa”, em mais outro “sofá de plumas”, e assim ia.

 

O contrato com André Brett acabou, e GG resolveu abrir uma boutique na Avenida Madison. Tudo ia muito bem, até que a boutique foi assaltada e ele perdeu tudo o que tinha. Terminaram os belos dias e começaram os duros tempos em que comia pedaços de pizza, bebia Coca-Cola. Se tivesse acreditado mais em sua cartomante, Zazá (Guilherme não fazia nada sem perguntar a ela), não teria aberto a boutique. Zazá havia dito que a aventura nova-iorquina não daria certo. Mas profetizou também que, depois, ele trabalharia numa grande Maison de costura francesa. Pela primeira vez, Guigui não acreditou em Zazá.

 

Foram meses de penúria. Depois de sete anos em Nova York, GG voltou ao Brasil, em agosto de 1985, sem nada, a não ser um apartamento vazio em São Paulo; sem dinheiro para comprar uma cama, dormia num colchão no chão. Mas aí toca o telefone. Era uma proposta: ele não gostaria de fazer um teste para trabalhar com Christian Dior? Para tanto, deveria ir a Paris ser entrevistado. Dior pagou a passagem e lá se foi Guilherme, que passou em todos os testes e assinou um contrato para ficar em Paris por um mês, para “diorizar” a cabeça antes de começar a trabalhar. Zazá tinha razão!

Durante seis anos, Guilherme fez a ponte aérea Rio – Paris. Trabalhava das sete as sete e, segundo ele, foi a época mais feliz de sua vida. Até que, depois de seis anos na Dior, teve problemas. Ele se sentiu injustiçado, e processou a casa por quebra de contrato. Processou, ganhou, voltou para São Paulo em 1991 e, com o dinheiro, comprou um apartamento. Os anos haviam passado e ninguém mais lembrava dele. Pois ele recomeçou e recuperou suas clientes, uma a uma. E passou a costurar também para suas filhas e netas.

 

Dorme às nove e meia, dez da noite, jamais vai a festas. Acha que o chique é cozinheira da casa fazer o jantar.

Guilherme tinha várias agendas: uma das clientes para as quais está trabalhando no momento, outra dos compromissos marcados, outra das ligações que deve fazer naquele dia, uma de Paris, outra de Nova York e mais uma de Buenos Aires, não só com o endereço dos amigos e dos restaurantes, mas com a descrição dos pratos de que gostou e pode querer repetir, outra com os telefones para onde deve ligar se perder os cartões de crédito (com os respectivos números), uma de São Paulo, mais uma do Rio. Todas elas - dos últimos 20 anos - estão guardadas.  

Para Guilherme, o luxo da vida é pegar um avião na hora que quiser, para onde quiser, sem ter que dar satisfação a ninguém, comprar objetos de arte – tem uma tapeçaria de Lurçat e um biombo Coromandel, além do Miró.

 

Guilherme dizia, sem pestanejar, que sua melhor cliente foi Lucia Flecha de Lima. Mandava os croquis, ela aprovava e os vestidos iam prontos e perfeitos. Em 1991, hospedado na embaixada em Londres, Lucia ligou para o quarto dele e disse que queria apresentá-lo a uma amiga. GG desceu, muito à vontade, e deu de cara com uma moça loura, altíssima e linda, vestida de jeans e uma jaqueta vermelha. Era Diana, a princesa de Gales. Disse que gostava muito das roupas que ele fazia para Lucia e que adoraria ter vestidos dele, mas o protocolo a impedia: ela só podia usar roupas de costureiros ingleses. 

Hildegard e Ruth Joffily escrevem a biografia de Guimarães, "Memórias de um costureiro", que, segundo a colunista, esperava lançar com ele ainda vivo. Ela conta que, no último ano, o estilista não pode trabalhar muito. Sem dinheiro, teve que recorrer à rede pública de saúde para se tratar do câncer. 

Guilherme morreu em 2016 aos 76 de câncer no fígado.

https://emais.estadao.com.br/noticias/moda-e-beleza,morre-no-rio-o-estilista-guilherme-guimaraes-icone-da-alta-costura-nos-anos-1960-e-70,10000096444#:~:text=O%20estilista%20foi%20%C3%ADcone%20da,e%20L%C3%BAcia%20Flecha%20de%20Lima.&text=No%20cinema%2C%20foi%20respons%C3%A1vel%20pelo,assinou%20figurinos%20de%20T%C3%B4nia%20Carrero.

https://piaui.folha.uol.com.br/materia/o-cheiro-de-cimento-me-inebria/


 

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